31 de agosto de 2010

A noite da carne

Andei por ruas escuras e desertas onde a multidão
dançava freneticamente
Corpos movendo-se numa coordenação aleatória
Mentes encontrando-se nas pupilas e vibrando juntas
através dos corpos alucinados
Idéias ressoando nos olhares psicóticos dos casais dançarinos


Andei no silêncio da noite onde o pio da coruja era abafado
pelo som doentio de músicas sem sentido
O ar gritando no ouvido ruídos insanos
A pressão explodindo ao redor, prendendo, aprisionando
A música convidando a enlouquecer


Andei por ruas sujas e fétidas
Onde o cheiro da podridão se misturava ao gosto suave
das nucas perfumadas
O ar impregnado com corpos chocando e espalhando feromônios
Sujeira sendo espalhadas pelos pés excitados e incontroláveis


Andei por ruas frias onde o calor dos corpos alheios fervia, queimava
Corpos sincronizando seus batimentos, dançando
a mesma música sem sequer estar a ouvi-la
Corpos tentando tornar-se um. Uno, com o cosmo
uno com a vida, uno entre si
Mentes tocando umas as outras, acariciando o ego, excitando


Andei por lugares onde cada um fazia sua própria música
e espalhava pelo ar
Onde os pés ritmados perdiam-se por entre bueiros podres
e dançavam entre a sujeira
Andei por lugares onde o tato era o único sentido usado,
os outros eram ignorados
Andei pelo meio da multidão enlouquecida e me misturei
Me contagiei e virei um ponto no meio daquelas ruas

27 de agosto de 2010

Motivações

"Cara, tu sai do Recife vem para cá sem ter falado com nenhum orientador e sem ter ninguém aqui que tu conheça - significa que com certeza tu NÃO estava satisfeito com a vida lá."
(A. -- em conversa informal)

Acho que algumas pessoas realmente pensam que eu resolvi mudar de vida por que estava insatisfeito com minha rotina no Recife. Eu mesmo sinto que meu discurso não soa convincente para a maioria das pessoas: eu estava muito bem em Recife, só queria vir por simples aritmética básica que, esta sim eu não posso negar, não gostei. Hoje graduado em física pela UFPE, o que me levou quatro anos e meio, e mestre também pela UFPE, o que me levou dois anos exatos - a defesa da dissertação foi no mesmo dia da colação de licenciado - sintia-me mais ou menos confortável naquele universo acadêmico onde eu tinha meu lugar e conhecia as pessoas já a, se deixei claro os números o leitor me acompanhou, seis anos e meio. A continha aritmética que não gostei foi somar, aos vinte e quatro anos que hoje tenho de vida, os próximos quatro anos que são comprometidos com o doutoramento. Isto significa que, em caso de fazer doutorado na UFPE - que é nível 7 na capes e tudo está tranquilo e preparado - eu saio de lá com vinte e oito anos e mais de dez anos sobre o mesmo teto universitário de sempre.

O objetivo da maioria das pessoas que faz graduação, pelo menos em física, e quer seguir a vida acadêmica lá no Recife, acredito, é ser professor da Universidade Federal de Pernambuco. O meu caso não é diferente. Quando for contratado, numa hipótese otimista, vou passar muito mais de dez anos sobre o mesmo teto. Por este objetivo eu quis sair um pouco, afinal de contas, como posso colaborar para a melhora e manutenção de um lugar do qual tudo que sei aprendi lá e tudo o que fazem me soa como natural?
...
Uma vez me disseram, e isto não me pareceu informação boba, que as mulheres tendem a querer engravidar na casa dos vinte. Seguindo alguns raciocínios (...) mulheres de trinta e poucos anos já são chamadas "titias" e por isto no final da década de seus vinte anos elas consideram com veemência ter ou não ter filhos em sua vida. Eu acho que a minha vida deve ter a alegria e simpatia que as crianças trazem, mas me sinto completamente leigo sobre cuidar das outras pessoas e, na verdade, sou leigo em diversos aspectos em como cuidar de mim. Filho único de mãe solteira, há muita coisa que me acostumei a ter em mãos com certa facilidade, dizendo de outra forma, eu mesmo não cuido de mim - como saberia cuidar de uma criança ou família? Existe a antigüíssima alternativa de se "aprender na tora", mas "prevenir é melhor que remediar". Nos Estados Unidos a cultura expulsa a criatura de casa quando esta tem dezoito anos e eu aqui, com vinte e quatro, não sei fazer nada que não use apenas ovo, água, pipoca ou macarrão instântaneo. Em uma carta para o meu primo, solicitei que ele pensasse um pouco no futuro dele - como acho que a todo conselho que se dá se deve refletir sobre si mesmo, aqui estou eu.

Evidentemente, pode-se resolver o problema acima alugando uma casa, não necessariamente indo para o outro lado do Brasil, mas a questão acadêmica é, e a ordem da exposição textual visa enfatizar este fato, tanto quanto este comentário, a motivação maior. Aqui a capes dá nível 7 ao Instituto de Física e meu currículo não sai pior do que sairia na UFPE - existe uma possibilidade, e esta eu fiquei sabendo depois, de meu bolso sair mais cheinho, mas depende de orientador e outras questões mais complicadas. O problema financeiro não é a preocupação, já que vim para um lugar onde se gasta muito mais que em Recife.

Existem diversos problemas a resolver: não estou com moradia garantida e não tenho orientador, ou seja, não tenho o que pesquisar e meu doutorado, por este motivo, ainda não começou de fato. Estas coisas se resolverão nas próximas semanas, claro, se eu me mover e tomar contas das rédeas da minha própria vida...

Estou aqui não por que quero a liberdade e a privacidade plenas, se bem que acabarei experimentando, mas por que mais cedo ou mais tarde algo pode vir a precisar de uma resposta rápida e tenho em mim que esta experiência pode me ajudar a responder devidamente.

26 de agosto de 2010

Saber

sei de nada, só sei que eu num faço questão de saber de nada
por que quem nada sabe não sabe que sabe de nada
e ainda assim vive feliz com isso

25 de agosto de 2010

Ontem à noite

Ontem eu vi a Lua.
Estava cercada pelas copas das árvores
e por um telhado de amianto.
Eram seis horas, a hora do crepúsculo e da saudade.
A Lua estava cheia e bela.
A Lua estava cheia e solitária no céu nublado.

24 de agosto de 2010

Tagarelando

No camarim do segundo blog encontrei algumas obras que Eu deixou em rascunho, poemas interminados e cheios de um sentimento de fazer poesia, não sei se por amor à poesia ou ao verdadeiro objeto alvo daqueles versos. Senti falta, enquanto li alguns dos poucos versos escritos pelo companheiro de blog, de mim. Não que eu não esteja comigo mesmo tempo suficiente para que haja possibilidade de sentir falta de mim mesmo, o que poderia ser diretamente interpretado das palavras anteriores, mas senti falta de minhas frases narradas ou pensadas no segundo blog como outrora quando minha intenção era mais distribuidamente alegre e não objetiva. Gostando de escrever pelo simples gosto de escrever, de alinhar idéias e às vezes tentar ser o máximo não-óbvio em poucas ou muitas palavras, me encontro cada vez mais vezes sem palavras certas para escrever despreocupadamente.

Falta de "falta do que fazer", pensei eu. Talvez, respondi em seguida. Mas o fato de você ter ocupações não deveria deixar seus poucos hobbyes para trás. Tudo bem, o tempo é escasso até mesmo para os hobbyes, imagine para as tarefas obrigatórias? Mas a verdade é que nunca acreditei quando companheiros de outros ou desse blog disseram que não havia tempo disponível para escrever mais. Na verdade sempre acreditei, e neste sempre se acrescente o presente do indicativo, que as pessoas param de escrever nos seus blogs porque perdem a vontade. Esta (vontade) está ligada a uma motivação particular que, segundo meu pensamento mais recente, pode não durar para sempre, aliás, não dura quando o principal interesse é regido pelo tempo. Como exemplo concreto posso citar um rápido debate que eu e Eu tivemos hoje a tarde no google talk sobre um contador de visitas para o nosso blog: traria uma motivação temporal da qual pode vir a ser uma desmotivação temporal...

Resumidamente, posso dizer que há tempo para continuar escrevendo, mas o que falta realmente é assunto para tratar da maneira usual, isto é, da maneira que estou acostumado a expor minhas idéias. Assuntos não faltam, já que passo por mudanças e estou ainda no meio do turbilhão das possibilidades de respostas a estas alterações de rotina, mas parece que a anarquia da poeira alta não dá nitidez suficiente para ser claro e objetivo na exposição das idéias que chegam, muitas vezes à cavalgadas, muitas vezes no casco da tartaruga. Logo, o problema poderia ser a preocupação de expor fraquezas e possíveis escolhas erradas no decorrer do caminho, porque mudanças trazem muitos aprendizados e estes incluem as tentativas e erros. Se fosse este o caso, se tenderia a escrever por versos de múltiplas interpretações e idéias incompletas, com o problema geral não particularizado para não ser ridicularizado, ou simplismente não se escreveria, o que me parece ser mais, ou muito mais, comum - este texto seria, sob esta hipótese, um negação de tudo isto.

Naturalmente, pensar na origem da sua própria vontade de fazer ou deixar de fazer algo não é fácil, podendo beirar o impossível, mas eu costumo pensar que mesmo as coisas impossíveis devem ser tentadas de vez em quando, se devidamente se verificou que as consequências são reversíveis.

Eu estou aqui, visitando meu próprio blog com regularidade e em diversos computadores (o que possivelmente renderia uma falsa leitura para um hipotético contator de visitas) da faculdade, onde estou passando a maior parte das minhas horas diárias. Me preparo para voltar a escrever minhas historinhas como um aluado no mundo das idéias, já que somos infelizmente ensinados a evitar se comportar como aluados no mundo das pessoas. A lua, lá no topo da abóbada celeste, está cheia e belíssima, e um aluado hoje estaria muito mais feliz que uma criatura genérica...

Abraço para todos e depois eu volto com outro texto destes.

17 de agosto de 2010

Noite nossa

A Lua novamente sobe ao céu
Caminhamos ao encontro noturno
Todos juntos, novamente

Vivemos para cantar, para lembrar, para amar
Estrelas que nós víamos já não existem mais
Os dias que passaram não voltarão
As trilhas que construímos,
Não usaremos jamais

Vem comigo, é domingo, vamos comemorar
Vem comigo hoje é festa
Hoje a festa é só nossa
Vem, já é noite e a Lua no céu nos espera ao encontro marcado

Amo a noite, eu te amo.
Amo o som da cachoeira.
Veja as pedras, são tão belas
Veja o fim, está tão longe
Vejo amor! É você!